domingo, 27 de novembro de 2011

Sem razões

Já era tarde da noite quando aproximou-se de Carina. Ela, sentada sobre os pés já sabia o que haveria de ser dito, havia algum tempo em que o silêncio tornara-se intérprete da solidão mútua, incômoda, entre os dois.
Mauro perguntou-lhe se queria fazer algo diferente naquele final de semana, talvez visitar algum amigo, ou ir na casa de um velho parente. A sensação que Carina sentia ao ver aquele homem em sua frente era única: alguém tentando impedir que a tempestade entrasse por uma casa onde o telhado são apenas telhas velhas, espaçadas, gastas por vários verões e invernos.
A esposa respondeu negativamente com a cabeça e novamente o silêncio voltou a fazer-lhes companhia. Há muito, Mauro não sorria e as conversas eram sempre focados em fatos do cotidiano, a vida prática que infiltrava-se com seus tentáculos fortes e secos. Não havia mais nada a ser feito.
O pior é que, apesar da situação ser flagrante, Carina sofria. Já não mais aquele desespero em que a consumia durante horas em que o marido não chegava e ela fantasiava ou adivinhava o que ele estava fazendo. A dor agora era mansa, uma dor resignada que esperava o desfecho, o golpe de misericórdia.
Mauro estava sentado em um banco, do lado esquerdo do fogão e brincava com o crochê na barra do forro da mesa enquanto a mulher envelhecia olhando para o homem para quem jurara amor eterno e a qualquer momento sairia de sua vida.
Jantaram, ela lavou os talheres e ele empenhou-se em consertar duas gavetas estragadas da cômoda. Mais tarde, deitaram-se e como algumas vezes, tocaram-se, fundiram-se e se afastaram. Lá fora, um poste de luz foi danificado com uma batida de carro.

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