sexta-feira, 4 de março de 2011

O dia em que fugi da chuva



          
Subi na moto como tantas vezes já havia feito, segurei-o não firmemente, apenas o suficiente para não despencar lá de cima e desabar no asfalto como um saquinho de água. Ele dirigia devagar como se fosse apenas mais um passeio, íamos para casa.
O céu começava a ficar escuro e algumas nuvens pressagiavam uma tempestade. Na garupa da moto, olhando fixamente à frente, vi os respingos de uma chuvinha passageira que estava prestes a nos pegar. Num lance rápido vi-o desviar do suposto caminho e buscar uma outra estrada, fiquei sem compreender no momento, foi como se, naquele instante, não soubesse exatamente o que estava acontecendo.
Ele então me disse que naquele lugar específico já estava chovendo, foi por isso que mudou de rota. Não consegui agüentar o riso. Senti uma sensação de poder instantâneo: pensem só, era como se ele escolhesse se molharia naquela chuva naquele dia, ou  deixaria para se molhar  depois. Ri como uma criança que acabou de fazer uma traquinagem e ainda não fora descoberta. Ele acelerou mais um pouquinho, afinal, a escolha de se molhar ou não, é eventual . O vento agora soprava mais forte e fui invadida por  um sentimento singular de liberdade.
Como eu gostaria de fugir mais vezes da chuva. Quantas vezes me vi em meio a grandes tempestades, sem ter nem ao menos uma velha sombrinha, misturei lágrimas com água e nem de longe conseguia vislumbrar um arco-íris. Algumas vezes, até pensei em ir embora com a enxurrada, intercalei rajadas de vento com trovoadas. Às vezes, os pingos nos batem como chicotadas e a intensidade de água no rosto nos impede de abrir os olhos. Em outros momentos, a humilhação de sermos atingidos pela lama, em alguma avenida da vida ,mancha a nossa raquítica esperança de dias melhores.
Mas não é somente das grandes tempestades que gostaria de fugir. Aquela chuvinha fina e persistente também já entristeceu meus dias. Você acha que consegue caminhar por ela, que quase não irá se molhar e quando vê está com frio incrustado na alma. Talvez seja uma das piores chuvas porque você a subestima, acha-a inofensiva. Já senti muita dor de ouvido recebendo estes respingos no rosto, fingimos não sentir dor mas o travesseiro sempre é o cúmplice anônimo desta história.
Seja uma chuva passageira ou uma tempestade, o certo é que um dia passa. Às vezes, temos que tirar o entulho abandonado pelo caminho, plantar novamente as nossas árvores, refazer a nossa morada, mas passa. Pode-se escolher ficar protegido dentro da casca quando se vê o céu nebuloso, mas para quem não tem medo de molhar e persiste em desafiar o mau tempo, há sempre a recompensa de dias ensolarados.

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